Afinal, o que é neurociência e qual o seu lugar na Educação?

A neurociência é um campo de conhecimento multidisciplinar que estuda o sistema nervoso. Ou seja, ela é construída a partir das contribuições de diferentes áreas, como psicologia, física, farmacologia, neurologia, para entender melhor como o cérebro funciona e como ele controla o comportamento e a mente humana.

Ainda que desde a Antiguidade o cérebro tenha sido objeto de estudos, foi apenas nos anos 1960 que o termo "neurociência" surgiu. Com o avanço da tecnologia e o desenvolvimento de técnicas de neuroimagem que permitem analisar a atividade cerebral em tempo real, os estudos na área se aprimoraram, principalmente a partir dos anos 90.


Reorganização de sinapses e redes neurais desencadeia aprendizagem

Hoje em dia, a neurociência tem contribuído para diferentes áreas – e uma delas é a educação. Considerar a neurociência no aprendizado é entender que a aprendizagem acontece por conta da reorganização das sinapses e de redes de neurônios, e que ela envolve outras funções mentais e é influenciada por estímulos externos, como o ambiente em que a aprendizagem ocorre e as interações sociais, entre outros.

Ao levar em conta essa relação entre neurociência e aprendizagem, professores(as), familiares e estudantes podem pensar em como potencializar esse processo, seja pensando em novas estratégias pedagógicas, outras maneiras de estudar, ou como garantir condições ideais de estudo. A neurociência do comportamento também ajuda a pensar essas mudanças.

A neurociência tem mostrado ainda que teorias da educação e da psicologia já consolidadas, como as dos pensadores Piaget, Dewey e Vygotsky, seguem atuais e precisas.

Como bem escrevem as autoras Ana Luiza Neiva Amaral e Leonor Bezerra Guerra no estudo Neurociência e educação: olhando para o futuro da aprendizagem:

"É importante esclarecer que a Neurociência não propõe uma nova pedagogia e nem promete solução para as dificuldades da aprendizagem, mas elucida aspectos sobre o funcionamento do cérebro aprendiz que acrescentam nova perspectiva para a prática pedagógica e contribuem para maior autonomia e criatividade do professor no desenho didático".

Assim, a neurociência deve apoiar a educação – mas não ser central ou vista como a solução para todos os desafios de aprendizagem enfrentados pelos estudantes.

Como a neurociência explica a aprendizagem

Como a neurociência explica a aprendizagem

"Eu já aprendi isso, mas não lembro!". Essa frase clássica parece resumir bem, ainda que de forma simplista, o que a neurociência nos diz sobre como aprendemos. Se não nos recordamos, então não podemos dizer que houve aprendizado.

Para que a aprendizagem definitiva ocorra, é preciso que ela se consolide no sistema nervoso por meio de um processo complexo – que inclui, imprescindivelmente, a memória. E, para que um novo conhecimento fique registrado na memória de longa duração, ele deve passar por processos de repetição, elaboração e consolidação.

Conforme uma informação é repetida, os circuitos neurais relacionados a ela são ativados mais e mais. Quando essa informação se conecta com outras que já conhecemos (elaboração), seja por ganchos com outros conhecimentos ou reativando-a de forma diferenciada, estimulamos novas conexões neurais.

Assim, considerando que a aprendizagem ocorre quando há uma reorganização de conexões neuronais, podemos dizer que consolidamos essa informação no cérebro. E toda vez que lembramos dela, ela é reconsolidada e, consequentemente, fica mais forte.

Além da memória, há outras funções que afetam a aprendizagem

A neurociência no aprendizado mostra que não é só a memória que importa para a aprendizagem. A atenção (outra função mental) tem um papel fundamental, já que seleciona quais informações que chegam ao cérebro devem ser armazenadas. Se não prestamos atenção, não processamos a informação e, consequentemente, ela não tem como ser aprendida.

A atenção tem uma forte ligação com as emoções, que são as percepções do cérebro sobre as interações pelas quais o indivíduo passa e suas manifestações fisiológicas (coração disparado, frio na barriga, etc). Elas desencadeiam comportamentos que melhor respondem a essas situações.

Conforme as autoras Ana Luiza Neiva Amaral e Leonor Bezerra Guerra explicam no estudo Neurociência e educação: olhando para o futuro da aprendizagem:

"As emoções indicam para o cérebro o que é importante para a sobrevivência do indivíduo. Aprendemos aquilo que nos emociona, o que é significativo e necessário para vivermos bem, e esquecemos o que não tem mais relevância para o nosso viver".

Tendo em vista esses pontos de encontro entre neurociência e comportamento, e neurociência e aprendizagem, podemos reconhecer a importância de que aulas e momentos de estudos aconteçam em um contexto significativo, conectado com diferentes assuntos, e em um ambiente que propicie a devida atenção dos estudantes.

Dicas da neurociência para melhorar o aprendizado

Dicas, comprovadas pela neurociência, para potencializar o aprendizado

Atualmente, muitos profissionais estudam o elo entre neurociência e educação para entender como utilizar os princípios da neurociência no aprendizado.

Roberta Ekuni, uma das principais pesquisadoras brasileiras sobre memória e aprendizagem, é uma dessas pessoas e compartilha algumas estratégias para driblar erros e fazer com que o estudo renda mais:

1. Em vez de decorar a forma como o conteúdo foi explicado, você deveria tentar lembrar por conta própria.

A prática de lembrar reativa as conexões neurais ligadas à nova informação, fortalecendo os caminhos da memória. Por isso, é preciso praticá-la sempre.

Assim, ao terminar de ler um texto, por exemplo, feche o material e tente explicar o assunto com as suas próprias palavras.

2. Em vez de estudar apenas na véspera da prova, você deveria distribuir o estudo ao longo do tempo.

Os princípios da neurociência no aprendizado explicam porque estudar um dia antes das avaliações não funciona. Esse estudo maciço não leva à elaboração e à consolidação do conteúdo na memória de longa duração. O que acontece é apenas a sua retenção de forma transitória, na chamada memória de trabalho.

"Supondo que haja uma prova surpresa um mês depois da oficial. Aquele aluno que estudou de forma espaçada provavelmente se sairá melhor que aquele que maratonou na véspera. O primeiro estuda para aprender; o segundo, só para a prova", explica Roberta.

3. Em vez de fazer várias coisas simultaneamente, você deveria focar sua atenção em apenas uma tarefa.

Estudos mostram que menos de 2% da população é capaz de executar duas tarefas cognitivas complexas simultaneamente. Por isso, estudar com o celular ao lado não é produtivo.

"O comportamento multitarefa é extremamente deletério para a aprendizagem, pois não nos permite prestar atenção – logo, não há memória nem aprendizagem", diz Roberta.

4. Em vez de tentar lembrar de tudo o que precisa fazer, você deveria anotar.

Quando precisamos gravar uma informação passageira por um período curto de tempo utilizamos a memória de trabalho. Ela é essencial para a nossa organização e aprendizagem, mas tem uma capacidade limitada.

Assim, ao anotar as tarefas do dia em um papel, você descarrega a sua memória de trabalho e abre espaço para armazenar informações mais relevantes.

Neurociência no aprendizado: dicas para ajudar o filho a estudar melhor considerando fatores que influenciam a aprendizagem

Comportamentos típicos da adolescência – como dormir bastante e ser imediatista, – podem ser explicados pelas transformações do cérebro nesta fase.

Depois da primeira infância, a adolescência é o período mais importante do desenvolvimento do cérebro. A substância branca aumenta, devido ao processo de mielinização nos circuitos neurais, e o córtex pré-frontal atinge o seu ápice. Essas mudanças são responsáveis pelo aumento da capacidade de tomar decisões, de raciocínio abstrato, de se relacionar com outras pessoas, de gerenciar as emoções etc.

Assim, veja dicas para potencializar a rotina de estudos considerando a neurociência do comportamento:

1. Garanta que o adolescente esteja descansado e alimentado

O sono é um fator fisiológico importantíssimo para o sucesso da aprendizagem. Isso porque, sem sono, o cérebro não produz as proteínas e as reações químicas necessárias para reorganizar as sinapses e, portanto, consolidar aquilo que processamos quando acordados.

Em média, um adolescente precisa dormir nove horas por noite, e o faz mais tarde porque existe uma inversão do padrão de sono. Por isso, considere esses horários na hora de organizar a rotina de estudo.

A alimentação também influi nesse processo, porque fornece nutrientes necessários para o funcionamento do cérebro.

2. Forneça um ambiente de estudos sem distrações

A atenção é fundamental para que a aprendizagem ocorra. Assim como quem está com sono não consegue prestar atenção, quem tem outras distrações no ambiente também não.

Televisão ligada, música tocando, celular vibrando com mensagens ou conversas paralelas tiram a atenção do objeto de estudo. Quanto mais tranquilo o ambiente, mais eficiente será o aprendizado.

3. Proponha atividades mão na massa

A neurociência no aprendizado indica que movimentar-se ajuda no desempenho cognitivo, na ativação da atenção, e no envia de sangue rico em oxigênio ao cérebro.

Assim, estimule atividades físicas nos horários livres e sugira atividades que envolvam o corpo, como construir uma maquete ou joguinhos que envolvam levantar da cadeira.

4. Ajude seu filho a lembrar

Se para aprender é preciso trabalhar a memória, então uma técnica efetiva é a prática de tentar tirar a informação da cabeça.

Proponha um jogo de trivia com o seu filho, com perguntas para retomar o conteúdo. Além de tornar o ensino divertido, garante um momento de interação – e aprendizado – em família.

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